Porque Ignoramos Alguém que Precisa de Ajuda?
Imagine que está a caminhar pela rua e vê uma pessoa cair no passeio. Em vez de correr para ajudar, olha à sua volta à espera que alguém tome a iniciativa. No entanto, ninguém parece reagir. Hesita e sente-se inseguro. Se todos estão a ignorar a situação, isso significa que também o deve fazer?
Este fenómeno desconcertante é conhecido como efeito do espectador (ou bystander effect, em inglês), que ocorre quando a presença de um grande número de pessoas reduz a probabilidade de que qualquer uma delas intervenha numa situação de emergência. Existem vários fatores psicológicos que explicam este comportamento, incluindo a difusão de responsabilidade, o medo do julgamento social e a falta de clareza sobre o que está a acontecer.
Continue a ler para perceber melhor porque isto acontece, quais são os principais fatores que influenciam esta atitude e como podemos superá-la.
O Que é o Efeito do Espectador?
O efeito do espectador, também chamado de apatia do espectador, refere-se à tendência das pessoas para evitarem agir em situações de emergência quando estão rodeadas por outras pessoas. Quanto mais gente estiver presente, menor é a probabilidade de que alguém intervenha.
Podemos pensar que, perante uma emergência, todos iríamos ajudar. No entanto, pesquisas psicológicas demonstram que a nossa reação depende do número de testemunhas. Se várias pessoas estão presentes e ninguém reage, é muito provável que também fiquemos parados.
Este comportamento é frequente e, provavelmente, já presenciou ou viveu uma situação semelhante.
Como Funciona o Efeito do Espectador?
Embora pareça que a presença de mais pessoas aumentaria as hipóteses de alguém ajudar uma vítima, vários estudos mostram que o oposto é verdade.
Pesquisas clássicas dos psicólogos Bibb Latané e John Darley demonstraram que, quanto mais observadores estiverem presentes, menor é a probabilidade de alguém agir.
Num dos seus estudos, os participantes estavam numa sala a preencher questionários quando, de repente, a sala começou a encher-se de fumo. Os resultados foram surpreendentes:
- 75% das pessoas que estavam sozinhas relataram o problema.
- Apenas 38% das pessoas acompanhadas por outros participantes reagiram.
- Apenas 10% daqueles que estavam com duas pessoas que ignoraram a situação tomaram alguma atitude.
Outro estudo mostrou que 70% das pessoas ajudariam uma mulher em apuros se estivessem sozinhas, mas esse número caiu para 40% quando havia outras pessoas presentes.
Exemplo Real do Efeito do Espectador
Um dos casos mais conhecidos em Portugal que exemplifica o efeito do espectador ocorreu em 2020, no caso do homicídio de Ihor Homeniuk, um cidadão ucraniano que morreu às mãos de agentes do SEF (Serviço de Estrangeiros e Fronteiras) no Aeroporto de Lisboa.
Apesar de haver diversos funcionários e testemunhas no local, ninguém interveio de imediato para impedir a violência, mesmo quando Ihor estava claramente em sofrimento. O caso gerou enorme indignação pública, levantando questões sobre a responsabilidade coletiva e a passividade diante de situações de abuso e injustiça.
Este episódio trágico demonstra como o efeito do espectador pode manifestar-se mesmo em locais vigiados, onde muitas pessoas têm conhecimento de uma situação grave, mas não tomam medidas imediatas para evitar um desfecho fatal.
Porque é que Isto Acontece?
Existem três fatores principais que explicam o efeito do espectador:
1. Difusão de Responsabilidade
Quando há muitas pessoas presentes, cada indivíduo sente-se menos responsável para agir. O pensamento comum é:
“Porque é que eu deveria intervir se outra pessoa pode fazer isso?”
2. Medo do Julgamento Social
Muitas vezes, evitamos agir por receio de sermos julgados pelos outros. Este fenómeno é chamado “apreensão da avaliação” – temos medo de sermos vistos como alarmistas ou de interpretarmos mal a situação.
3. Ignorância Pluralista
Quando olhamos à nossa volta e vemos que ninguém está a reagir, assumimos que não há motivo para intervir. Se ninguém está a fazer nada, talvez não seja assim tão grave.
Como Podemos Evitar o Efeito do Espectador?
Felizmente, há formas de evitar este comportamento e agir de forma mais solidária:
- Consciência: O primeiro passo é perceber que o efeito do espectador existe e pode influenciar-nos.
- Assumir a responsabilidade: Se precisar de ajuda, faça um pedido direto a alguém – por exemplo, “Você, de casaco azul, pode ajudar-me?” Isso reduz a difusão de responsabilidade.
- Dar o primeiro passo: Muitas vezes, basta uma pessoa tomar a iniciativa para que os outros a sigam.
- Ser um defensor ativo: Quando presenciar casos de assédio, bullying ou discriminação, intervenha de forma segura.
- Segurança em primeiro lugar: Se a situação for perigosa, chame as autoridades ou procure ajuda de forma segura.
O efeito do espectador é um fenómeno psicológico intrigante que mostra como a presença de outras pessoas pode influenciar as nossas ações. Ao reconhecer este padrão e adotar estratégias para contrariá-lo, podemos tornar-nos indivíduos mais responsáveis e empáticos.
Na próxima vez que vir alguém a precisar de ajuda, lembre-se: a sua iniciativa pode fazer toda a diferença!